domingo, 18 de setembro de 2016

Canadá : Das Montanhas Para a Cidade
Se o objectivo da viagem ao Canadá foi, essencialmente, desfrutar das Montanhas Rochosas indiscutivelmente belas, não falar de algumas das cidades visitadas seria uma grande injustiça. Todas elas, apesar das suas normais diferenças, são bastante harmoniosas e a vida das pessoas desenrola-se aparentemente com tranquilidade e boa educação.
Calgary
Localizada a leste das Montanhas Rochosas do Canadá cerca de 100 km, Calgary foi a cidade que nos recebeu na zona ocidental deste grande país. Com um pouco mais de um milhão de habitantes, não difere, na sua estrutura urbana, de qualquer outra grande cidade do continente norte-americano. Apresenta enormes edifícios concentrados na downtown e zonas residenciais com casas unifamiliares e edifícios de média dimensão a espalharem-se por largos quilómetros em redor. 

Cartaz de promoção do Stampede
Calgary estava em festa. Decorria um dos eventos mais famosos do Canadá, o Calgary Stampede, para o qual tínhamos comprado ingresso através da internet, ainda em Portugal, que nos permitiu viver o espectáculo durante dois dias. De bilhetes na mão, lá entrámos para o enorme recinto ao ar livre, semelhante àqueles que existem para corridas de cavalos. O evento abriu oficialmente com a presença do Mayor da cidade acompanhado pelo chefe da comunidade índia vestido a rigor tal como nos habituámos a ver nos filmes. Assistimos ao tradicional rodeio, a corridas de carroças miniatura e provas de montaria que nos remeteram para os velhos filmes do Oeste Americano. A festa não se ficou por aí. Se durante o dia decorreram as provas ligadas ao gado, à noite exibiram-se numerosas bandas filarmónicas daquelas tipicamente americanas, compostas por um elevado número de elementos que tocavam enquanto executavam complexas coreografias, acompanhadas de mudanças rápidas de cenários. Observadas da parte mais alta das bancadas, toda a sua movimentação resultava num efeito visual espectacular e impossível esquecer. No meio de uma enorme plateia composta essencialmente por canadianos de tal modo entusiastas como se fosse a primeira vez que assistiam, posso dizer que eu, emocionada e com o meu chapéu de cowboy comprado anteriormente, me senti um pouco canadiana. Em toda a cidade, não me lembro de ter visto alguém sem o típico chapéu na cabeça. Frequentemente nos cruzámos com famílias trajadas a rigor, acabadinhas de sair de uma série televisiva do tipo "Dallas". Era o que parecia. Botas de montar ricamente adornadas, coletes com franjas ou bordados, cintos de enormes fivelas chapeadas em prata. As calças de ganga e camisas de xadrez eram aqui rainhas e toda esta multidão festiva se deslocava em grande animação pelas ruas emolduradas por montras exibindo pinturas alusivas à vida dos cowboys. Os índios também não ficaram sem a sua participação. Foi possível visitar as suas típicas casas, as famosas tendas de forma cónica, expostas num enorme recinto. Pareceram-me socialmente integrados, mas voltei a vê-los várias vezes, noutros lugares, ficando com a sensação de que pertenciam ao sector mais pobre da sociedade.

Um pouco mais longe da cidade e do centro da festa, fica o Heritage Park Historic Village. Um conceito de parque museu que nos transportou para o mundo americano do séc. XVIII a inícios do séc. XX. Habitações de madeira destas épocas recolhidas de outros locais, foram ali recolocadas, permitindo recriar uma pequena cidade com o seu banco, padaria onde foi possível comprar pão e bolos e degustá-los no inevitável saloon. Uma loja antiga, os estábulos, a ferraria onde o ferreiro executava pequenos trabalhos, o cárcere, etc. bem como a circulação dos funcionários do museu em veículos da época, ajudaram a dar a credibilidade necessária. A extensão do museu permite a deslocação de uma ponta a outra num comboio a vapor, verdadeiro. Todos os funcionários, cada um nas suas funções, se apresentavam trajados com roupas da época, incluindo o chefe da estação. Para tornar ainda mais real toda a encenação e recriação dos ambientes dos séculos passados, fomos surpreendidos com uma numerosa família Amish no seu peculiar traje, antiquado, que os caracteriza e diferencia no mundo de hoje. Não eram, de modo algum, figurantes, eram simplesmente turistas. Voltámos a encontrar outras famílias noutras cidades do Canadá.

Kamloops

Depois de umas centenas de quilómetros percorridos em cerca de cinco horas de caminho, as Montanhas Rochosas ficaram para trás, mas não o deslumbramento com a sua beleza. A paisagem mudara e a temperatura também. Olhávamos, agora, para campos cultivados, onde os verdes se misturavam com tons dourados consentâneos com os 40°C que por ali suportámos, para descobrirmos manadas de búfalos aproveitando os pastos e sempre supervisionadas pelos "cowboys" nos seus cavalos. Estávamos na região de Kamloops. Situada no centro do Estado de British Columbia e banhada pelo rio Thompson, mostrou-nos aspectos da vida rural que nos remeteram, mais uma vez, para qualquer filme Western. Por isso, visitámos com prazer, um rancho recuperado e transformado em museu onde não faltou a recriação dos modos de vida de então, incluindo um assalto com bandido e pistola no qual fomos nós as "vítimas". Uma excelente simulação. Pertíssimo da cidade de Kamloops, tivemos oportunidade de visitar escavações arqueológicas de vestígios de casas dos índios Secwepemc, uma delas ainda em perfeitas condições, que nos permitiu compreender o espaço doméstico deste povo. A estação arqueológica está integrada no Sewepemc Museum and Heritage Park.

Vancouver
Vancouver
Situada na costa ocidental do Canadá, entre as montanhas e o Pacífico, é uma cidade multicultural muito bem organizada. Pouco ruidosa para uma grande metrópole, com edifícios de média elevação, exceptuando na downtown, não causou impressão negativa para nós, visitantes já acostumados ao silêncio das Montanhas Rochosas. As ruas do centro da cidade apresentavam uma coisa curiosa: esculturas de golfinhos decorados ao gosto dos seus criadores, incluindo um deles caricaturando Elvis Presley para deleite de quem fosse fã. Os passeios impecáveis, possibilitavam a circulação de deficientes ou idosos em cadeiras de rodas eléctricas que, provavelmente por isso mesmo, encontrámos com alguma frequência. A Water Street, rua muito simpática, virada para o comércio e turismo, vem mencionada em qualquer guia e é famosa pelo seu curioso relógio a vapor que fica sempre bem na fotografia. Aqui o que mais me deslumbrou, de facto, foram as lojas de artesanato índio. Encontrei alguns objectos com preços relativamente acessíveis. Das lojas de arte índia já não poderei dizer o mesmo! Peças lindíssimas que não ousei sequer pensar que algum dia as poderia adquirir. A Chinatown em Vancouver é bastante aprazível e, a meu ver, influenciada pela organização e ordem existentes no Canadá. Apresentava-se bem limpa e cuidada e não fosse a decoração das fachadas, das montras e toda a parafernália de produtos chineses à venda, pensaríamos estar apenas num bairro mais modesto da cidade.
Vancouver

Demos uma saltada até aos arredores de Vancouver para visitar o belíssimo Capilano Park. Mais floresta claro e nem por ser uma constante em terras canadianas isso nos causou aborrecimento, era mesmo um prazer desfrutar assim da natureza. Uma das grandes atracções aqui encontradas foi sem dúvida a ponte suspensa a desafiar os mais corajosos nos quais nos incluímos. Com 140 metros de comprimento a uma altura de 70, sempre a baloiçar, a meio do percurso precisei mesmo de arranjar um bocadinho mais de coragem para conseguir olhar para o rio Capilano que lá em baixo corria, indiferente, pelo seu caminho de sempre. Sobrevoar Vancouver em hidroavião foi mais outro desafio para quem não estava habituado. Ver assim a cidade envolvida pelo enorme xaile verde de montanhas e parques florestais, recortada finamente pelos fiordes como se de franjas se tratasse; Observar o transporte de enormes troncos de árvores que, flutuando lá em baixo sobre as águas, iam sendo dirigidos para os lugares de destino; Sobrevoar a baixa altitude sobre tanta beleza, fez-me sentir renascida, leve, embora o cansaço de dezasseis dias de viagem e de milhares de quilómetros percorridos, já desse alguns sinais. Não podia ter terminado de melhor forma a nossa viagem por terras do país a que os europeus chamaram Mundo Novo

Manuela Santos